Cientistas canadenses observaram pela primeira vez um fenômeno raro: um neutrino solar convertendo um isótopo raro de carbono em um isótopo de nitrogênio de vida curta, realizando efetivamente uma das reações de menor energia possíveis na natureza. É uma verdadeira alquimia científica — uma partícula verdadeiramente esquiva reconstruindo um núcleo atômico, desempenhando o papel de um feixe de teste de um acelerador de partículas natural: o Sol.

Fonte da imagem: SNO+
O experimento foi conduzido por cientistas da colaboração SNO+. O detector de neutrinos está localizado no laboratório subterrâneo SNOLAB, no Canadá, a uma profundidade de 2 quilômetros. A espessura da camada terrestre acima do detector filtra a maioria das outras partículas elementares, permitindo a passagem apenas dos neutrinos. Os neutrinos são transparentes não apenas para o nosso planeta, mas até mesmo para uma parede de chumbo com a espessura de um ano-luz (em tal parede, a probabilidade de um neutrino colidir com um átomo de chumbo é de 50%).
Era importante para os cientistas observar os neutrinos solares. Isso é relativamente simples, pois eles não são tão energéticos quanto os neutrinos atmosféricos ou cósmicos produzidos em explosões de supernovas e outros fenômenos incrivelmente poderosos do Universo. O detector de neutrinos do SNOLAB é um recipiente esférico preenchido com cintilador líquido, contendo aproximadamente 800 toneladas de alquilbenzeno linear. O isótopo carbono-13 (¹³C) está naturalmente presente na solução — em uma concentração de cerca de 1,1%. É difícil imaginar a probabilidade de uma partícula com interação fraca colidir com um átomo de ¹³C. Mesmo assim, cientistas já registraram diversos eventos desse tipo.

Ao interagir com um núcleo de ¹³C, composto por seis prótons com carga positiva e sete nêutrons neutros, um neutrino arranca um elétron de um nêutron, convertendo-o em um próton. Fotodetectores detectam esse evento como um brilho fraco no cintilador. Essa transmutação transforma o núcleo em um átomo do isótopo nitrogênio-13 (¹³N) com sete prótons e seis nêutrons. O isótopo ¹³N é instável e decai após aproximadamente 10 minutos, emitindo um pósitron, que também faz o cintilador brilhar e registrar o evento. Dois flashes característicos em um intervalo de tempo específico indicam a transmutação de ¹³C em ¹³N e nada mais.
Ao longo de 231 dias de observações (de maio de 2022 a junho de 2023), 60 eventos candidatos foram detectados. A análise estatística revelou 5,6 eventos causados por neutrinos, valor próximo aos 4,7 teoricamente esperados. Esta é a medição direta de menor energia da seção de choque para tal reação. A descoberta confirma as previsões teóricas sobre interações fracas de neutrinos em baixas energias e permite que os neutrinos solares sejam usados como um “feixe” natural para o estudo de processos nucleares raros, impulsionando ainda mais a física fundamental.
