Pode parecer estranho para alguns, mas a existência de 22 formas ou fases de gelo foi confirmada na natureza, duas das quais são amorfas e as demais são cristalinas. O gelo cristalino da forma Ih é encontrado em todos os lugares da Terra e na vida humana e, menos comumente, em duas outras formas de gelo cristalino: Ic, encontrado apenas nas camadas superiores da atmosfera, e XI, encontrado na Antártida. Recentemente, cientistas criaram outra forma: gelo “plástico”, antes conhecido apenas em teoria.

Fonte da imagem: Institut Laue-Langevin

É importante notar que a descoberta não foi feita por pura curiosidade. Gelo semelhante pode ter se formado nas profundezas de planetas como Netuno, bem como nas profundezas subglaciais do oceano global de Europa e outros satélites de Saturno e Júpiter. Sintetizar amostras desse gelo nos permitiria estudar suas propriedades e compará-las com dados teóricos, ajudando-nos a entender melhor outros mundos tão diferentes da Terra.

Em pressões acima de 20.000 bar (20.000 kg/cm²), os cristais de gelo são comprimidos e transformados em gelo VII, uma estrutura cúbica densa na qual as moléculas são organizadas como os cubos de um cubo mágico. O gelo VII foi descoberto em diamantes formados no manto da Terra e acredita-se que seja encontrado dentro de outros planetas.

Mais de 15 anos atrás, simulações de computador mostraram que quando o gelo VII é aquecido e submetido a pressão extrema, moléculas individuais de água devem se depositar no topo da rede cristalina (como no gelo comum), mas também começam a girar livremente, como em um líquido. Como a fase hipotética tinha a mesma estrutura cristalina cúbica do gelo VII, ela foi chamada de gelo plástico VII. Entretanto, naquela época, conduzir experimentos em pressões tão altas era tecnicamente impossível, e não havia evidências convincentes da existência de gelo plástico.

Pesquisadores do Institut Laue-Langevin (ILL), na França, desenvolveram equipamentos que podem fornecer a pressão e a temperatura necessárias simultaneamente. A água foi aquecida a 326°C e a pressão foi aumentada para 60.000 bar. Usando espalhamento de nêutrons quase elástico (QENS), a amostra foi irradiada e os resultados foram registrados por detectores. Descobriu-se que as moléculas de água nos vértices da rede cristalina hexagonal giravam como na água líquida, mas ao mesmo tempo “mantinham sua ordem” na rede, permanecendo em estado sólido.

O tipo de rotação — intermitente, com troca de ligações atômicas — foi uma surpresa para os cientistas, já que a teoria não previa tal comportamento. Este é o valor de um experimento: ele nos permite descobrir algo novo que a teoria não poderia prever.

Em temperaturas acima de 177 °C e pressões de cerca de 30.000 bar (cerca de 28 vezes maior que a pressão no ponto mais profundo dos oceanos do mundo), a equipe de cientistas observou uma fase cristalina cúbica de gelo na qual as moléculas de água giravam aproximadamente na mesma velocidade da água líquida. Eles identificaram esta fase como gelo plástico VII, confirmando finalmente sua existência.

As condições para a formação natural de gelo plástico provavelmente não existem no sistema solar. No entanto, já existem sugestões sobre a existência de enormes exoplanetas com um oceano global, onde podem ser formadas condições subaquáticas profundas para o aparecimento de tal fase de gelo no fundo. E então surge a pergunta: haverá uma troca de sais entre o fundo e a água, o que poderia contribuir para o surgimento da vida? Há muitas questões desse tipo, e os cientistas deram o primeiro passo para estudá-las criando gelo plástico artificial em laboratório.

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